O ‘Jornal do Caso República’ – jornal de luta ligado ao PS editado pelos directores e redactores após o ‘República’ ter sido tomado pela comissão de trabalhadores controlada pelo PCP – publicou, em 27 de Junho, uma entrevista da célebre jornalista italiana Oriana Fallaci a Álvaro Cunhal – com o sugestivo título ‘Oriana Fallaci põe Cunhal a nu’.
A abrir a entrevista, as impressões que a jornalista recolheu ao longo da conversa com o secretário-geral do PCP: “O homem que hoje tem mais autoridade em Portugal, o homem que hoje tem influência sobre os militares que ocupam o poder, o homem que venceu apesar de ter perdido as eleições, é Álvaro Cunhal (...) Entrevistá-lo não é fácil (...) Entre as coisas que pensa, que quer, que em parte já obteve, está o repúdio total das liberdades democráticas. (...) Oculta o que se refere à sua pessoa, negando-se a contar se tem família e onde viveu desde a sua fuga da forteleza de Peniche (em 1960). Parece que viveu em Moscovo e que se casou com uma russa. Paradoxalmente, é um homem simpático (...) Tem uma inteligência viva e lúcida (...) É difícil fugir ao fascínio do seu rosto, quase imberbe, de devoto, aos seus olhos azuis e cabeleira branca que tanto agradam às mulheres (...).
Aqui ficam as passagens mais significativas das respostas de Cunhal – que tanto escândalo provocaram em Portugal quando foram publicadas pelo ‘Jornal do Caso República’. O PCP reagiu então à publicação da entrevista, negando que Álvaro Cunhal alguma vez tenha dito o que disse.
- “Nós, os comunistas, não aceitamos o jogo das eleições (...) Se pensa que o Partido Socialista com os seus 40 por cento de votos, o PPD, com os seus 27 por cento, constituem a maioria, comete um erro. Eles não têm a maioria”.
- “Estou a dizer que as eleições não têm nada, ou muito pouco, a ver com a dinâmica revolucionária (...) Se pensa que a Assembleia Constituinte vai transformar-se num Parlamento comete um erro ridículo. Não! A Constituinte não será, de certeza, um órgão legislativo. Isso prometo eu. Será uma Assembleia Constituinte, e já basta (...). Asseguro-lhe que em Portugal não haverá Parlamento (...)”
- “(...) Nós, os comunistas, já tínhamos afirmado aos militares que o PPD não devia estar presente [nas eleições], que não se podia conduzir o país ao socialismo por meio de uma ampla coligação democrática. Mas eles quiseram juntar socialistas, comunistas, sociais-democratas e as diversas correntes do MFA... Tínha-mo-los avisado de que as eleições constituiam um perigo, que eram prematuras, que se não se tomassem precauções as perderíamos”.
- “(...) A solução dos problemas depende da dinâmica revolucionária; ao contrário, o processo democrático burguês quer confinar a revolução aos velhos conceitos do eleitoralismo (...)”
- “(...) Democracia para mim significa liquidar o capitalismo, os monopólios. E acrescento: não existe hoje em Portugal a menor possibilidade de uma democracia como as da Europa Ocidental (...)”
- “(...) É um facto indiscutível que Portugal actualmente se dirige para o comunismo. A única coisa que não posso dizer é que forma assumirá esse socialismo. Talvez devesse poder dizê--lo, dado que sou o responsável por um partido que que não foi derrotado, muito pelo contrário. Nós, os comunistas, quere-lo-íamos integralmente mas devemos ter em conta uma realidade muito complicada e muito contraditória. O nosso programa de um Portugal comunista está certamente sujeito a rectificações (...)”.
- “(...) Nunca vi uma revolução que se desenvolva sem o apoio dos militares ou de uma força militar. Veja Cuba. Como Castro não dispunha de um exército teve que fazê-lo. E nós, que dispomos de um exército já estruturado, devemos ignorá-lo? Acredite-me, sem armas não se consegue nada”.
- “(...) O MFA não é comunista nem socialista. Trata-se de revolucionários diferentes dos tradicionais. Na realidade, ideologicamente, têm correntes distintas. Mas, é inevitável que nós os comunistas estejamos de acordo com eles, porque os seus objectivos são os nossos. E um desses objectivos é o poder político constituído por um elemento popular e por um elemento militar. Quem, senão os operários comunistas, as massas comunistas, esteve ao lado dos militares desde o 25 de Abril? As forças democráticas, os socialistas, juntaram-se a eles no último momento. Apenas desfraldaram as suas bandeiras depois da vitória deles (...)”.
REVOLUÇÃO DIA-A-DIA
28 de Junho - Comício do PCP, em Lisboa: “Com o PCP para unidade popular, rumo ao socialismo”.
30 de Junho - Fuga de 80 agentes da PIDE da cadeia de Alcoentre; CDS é admitido na União Europeia das Democracias Cristãs.
2 de Julho - Manifestação das comissões de trabalhadores da Cintura Industrial de Lisboa.
O grande companheiro de Mário Soares na luta contra o “avanço comunista” durante o PREC – amizade que começara em 1958, quando ambos se encontraram na candidatura do general Humberto Delgado à Presidência da República. Advogado de renome. Os dois homens iniciaram então o mesmo caminho político. Entre 1974 e 1982 fez parte da direcção do PS e foi presidente do Grupo Parlamentar. Separou-se definitavamente do velho amigo em 82, por Mário Soares ter recusado o apoio do PS á recandidatura de Ramalho Eanes à chefia do Estado. Em 1986, Zenha candidatou-se à Presidência da República, contra Mário Soares, que foi eleito. Morreu em 1993, aos 70 anos.
"A NÓS, COMUNISTAS, AGRADA-NOS O MISTÉRIO"
Oriana Fallaci - Soares diz: vem mesmo a União Soviética.
Álvaro Cunhal - E a mim que me importa o que diz Soares?
O. F. - Quando regressou a Portugal, Cunhal?
A. C. - Não sei, não me recordo.
O. F. - Vamos, faça um esforço.
A. C. - Deve ter sido a 29 ou talvez a 30. Sim, a véspera do 1.º de Maio. Mas já cá tinha estado muitas vezes, clandestinamente. O governo fascista jamais me impediu de o fazer (...)
O. F. - E como é que necessitou de quatro dias para chegar? Donde veio?
A. C. - De Paris, mas não lhe direi onde estava antes de chegar a Paris.
O. F. - Não importa. Eu sei. Estava em Praga.
A. C. - Não estava em Praga, mas não lhe direi onde estava. A vocês jornalistas agrada-lhes muito o mistério, mas isso também nos agrada a nós comunistas. A diferença está em que vocês sentem prazer em descobrir coisas, ao passo que nós gostamos de ocultá-las. É uma maneira de manter vivo o interesse por nós.
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