Um estudo realizado pelo Pew Research Center, em dezembro de 2024, revelou que cerca de metade dos adolescentes nos EUA (46%) estão quase constantemente online. Numa década (2014-2024), esta percentagem praticamente duplicou: passou de 24% para 46%. O YouTube lidera as preferências dos mais jovens seguido pelo TikTok, Instagram e Snapchat. Por contraste, o Facebook registou uma queda acentuada de popularidade entre os jovens na última década. Esta verdadeira imersão dos mais novos no mundo virtual suscita preocupação, pois acarreta problemas de relacionamento interpessoal, riscos para a saúde mental e segurança.
Diversos pais, escolas e governos têm reagido a esta utilização excessiva das redes sociais com proibições e restrições, designadamente excluindo o uso dos telemóveis nas escolas. A EBS Dr. Ferreira da Silva, de Oliveira de Azeméis, que se destacou, no ranking do ano passado, por ser a escola pública com melhores notas nos exames nacionais, tomou a decisão de proibir os telemóveis em todo o recinto escolar. De acordo com o seu diretor, esta resolução teve um impacto muito positivo no convívio entre alunos.
As relações sociais são uma competência que se adquire essencialmente no mundo real em contato direto com os outros; ou seja, face a face. Além disso, torna-se fundamental promover outros hábitos, incentivando atividades ao ar livre, exercício físico, leitura, que são essenciais para o desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes.
Também a saúde mental pode ficar afetada pela utilização excessiva das redes sociais. Vários estudos indicam uma correlação entre a permanência intensiva nas redes sociais e o aumento de sintomas de ansiedade, depressão e inclusive de comportamentos autolesivos. Além disso, a exposição constante a conteúdos que promovem a necessidade de validação social, ideais de beleza, sucesso pessoal, e a vidas aparentemente perfeitas, pode contribuir para sentimentos de frustração e baixa autoestima.
As redes sociais podem potenciar a violência entre adolescentes e jovens. A partilha de fotos ou vídeos íntimos, de conteúdo sexual, sem autorização ou consentimento (sexting) — situação denunciada recentemente na Universidade do Porto — , o término súbito de uma relação amorosa sem qualquer explicação, aviso e ignorando/bloqueando as tentativas de contacto (ghosting) ou a agressão, humilhação, ameaças repetidas contra uma pessoa (ciberbullying), são alguns exemplos de violência cometida nas redes sociais que podem conduzir as vítimas a depressões gravíssimas, levando inclusive ao suicídio.
Existem diversos grupos que provocam um autêntico sequestro, através do algoritmo, de adolescentes fragilizados emocionalmente ou sugestionáveis, promovendo a violência, a automutilação, o suicídio, a anorexia nervosa, comportamentos de risco, etc. Estes grupos representam influências perigosas às quais os pais devem estar bastante atentos.
A comunicação com os filhos é essencial. Em casa de família não deve haver portas fechadas, pois se o adolescente se isola sistematicamente no quarto, recusa o convívio com os pais e irmãos, isso é um sinal de que não está bem psiquicamente e precisa de ajuda. É fundamental que os pais estejam sensibilizados para os sinais de alerta relacionados com o uso excessivo e inadequado destas novas tecnologias de comunicação e adotem práticas de acompanhamento, ajuda e orientação.
A utilização excessiva do telemóvel pode ser considerada uma forma de adição não relacionada com uma substância. Na verdade, com frequência estão presentes sintomas semelhantes aos observados em outras dependências, como a necessidade irrefreável de usar o dispositivo, problemas de controlo, com uso cada vez mais prolongado, e abstinência quando afastado do telemóvel. A abstinência pode manifestar-se através de humor irritável, ansiedade ou tristeza quando o acesso é limitado ou restringido. Este fenómeno pode explicar, pelo menos em parte, o aumento crescente do tempo de utilização das redes sociais observado nos últimos anos.
Esta adição acarreta uma componente perversa, pois com o tempo é preciso aumentar o estímulo para obter o mesmo efeito. Recentemente tivemos um exemplo chocante no nosso país. Um dos vídeos filmados pelos três “tiktokers” que são suspeitos de violar uma menor de 16 anos em Loures foi visualizado 32 mil vezes na rede social em que foi publicado. Isto é um sinal de absoluta decadência moral: perdeu-se a noção do bem e do mal.
Pessoalmente estou convicto de que estamos perante um problema social e de saúde pública grave. Mas é necessário que surjam mais estudos para se verificar se a utilização das redes sociais, pelos adolescentes e jovens, se está a transformar na “nova heroína do século XXI”. Os dados do aumento exponencial do número de adolescentes que estão constantemente online não nos deixam tranquilos. Importa por isso que os pais, os professores e os governantes, desempenhem um papel crucial na formação e no estabelecimento de regras e limites que ajudem à boa utilização das redes sociais.
Se quisermos retirar esta geração de estar quase constantemente online, temos de lhes dar razões para querer estar offline.
Mental é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com a Saúde Mental. Resulta de uma parceria com o Hospital da Luz e com a Johnson & Johnson Innovative Medicine e tem a colaboração do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos e da Ordem dos Psicólogos Portugueses. É um conteúdo editorial completamente independente.
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