A 15 de agosto de 2014, há quase seis anos, Rúben Neves entrou em campo com 17 anos e cinco meses. O adversário era o Marítimo, em jogo a contar para a Primeira Liga, e o médio marcou um dos golos da vitória dos dragões. Tornou-se o jogador mais novo de sempre do FC Porto a marcar um golo na equipa principal, registo superado esta temporada por Fábio Silva, ainda que continue a ser o mais precoce a fazer golo no Campeonato. No banco de suplentes, a apostar pela primeira vez em Rúben Neves, estava Julen Lopetegui. E esta terça-feira, na Alemanha, jogador e treinador reencontravam-se.

Um a orientar o Sevilha, o outro a liderar o Wolverhampton. Na antevisão, Rúben Neves não esqueceu a aposta de Lopetegui, há seis anos, e garantiu que o treinador espanhol continua a ser um elemento fulcral na sua carreira. “Lopetegui é muito especial para mim. Pôs-me a jogar com 17 anos e estou muito agradecido por isso. É algo que não se vê todos os dias em Portugal, pelo menos em 2014 não davam minutos a jogadores tão jovens. Quero vencer, claro, mas vou estar sempre muito agradecido. É um grande treinador, trabalha muito bem, quer jogar bom futebol”, disse o internacional português em entrevista ao jornal Marca.

Em Duisburg, na Alemanha, espanhóis e ingleses disputavam uma das últimas vagas nas meias-finais da Liga Europa, já conscientes de que o próximo adversário em caso de qualificação seria o Manchester United de Bruno Fernandes, que eliminou o Copenhaga. E se para o Sevilha, apesar de tudo, o apuramento é principalmente uma questão de dignidade e de respeito pelo passado, depois das três Ligas Europa conquistadas de forma consecutiva, para o Wolves a história desta competição europeia continuava a significar algo mais. A campanha europeia dos ingleses começou há mais de um ano, depois do histórico sétimo lugar na primeira época de regresso à Premier League, e é nesta altura uma de duas bóias de salvação que podem colocar o clube novamente na Europa no próximo ano — a outra prende-se com a eventual conquista da Liga dos Campeões por parte do Manchester City. Ainda assim, e apesar dessa indecisão, Nuno Espírito Santo garante que continua “orgulhoso” da equipa que orienta.

“Tem sido uma viagem longa, não apenas esta temporada. Uma viagem longa que começou há três temporadas, no Championship. É basicamente o mesmo grupo de jogadores. Tem sido tudo sobre construir uma equipa, criar uma identidade e estamos ansiosos por competir e fazer um bom jogo. Fomos capazes de criar uma identidade. E essa é uma das coisas mais preciosas no futebol, ter uma identidade baseada no estilo de jogo e na forma como lidamos com as nossas regras e tarefas, como lidamos com os problemas”, explicou o técnico, acrescentando que essa identidade tem alicerces no “respeito e no trabalho árduo”. “E é isso que queremos mostrar: uma boa equipa, com uma identidade, comprometida com o desafio”, terminou Espírito Santo na antevisão da partida.

Nos ingleses, Nuno Espírito Santo deixava Diogo Jota no banco de suplentes, assim como já tinha acontecido contra o Olympiacos, e apostava em Rúben Vinagre no onze inicial, enquanto que Dendoncker rendia o lesionado Jonny Castro. Do outro lado, Lopetegui deixava o ex-FC Porto Óliver Torres no banco e lançava o trio Ocampos, En-Nesyri e Suso na frente de ataque, repetindo o onze que eliminou a Roma na ronda anterior. Os primeiros instantes mostraram desde logo que o Wolves queria implementar a jogada típica que normalmente resulta em golo: velocidade e profundidade no corredor direito com Traoré, cruzamento ligeiramente atrasado à procura de Raúl Jiménez e cabeceamento do mexicano. A primeira tentativa, porém, saiu à figura de Bounou (1′).

A melhor oportunidade da primeira parte acabou por ser desperdiçada pelo mesmo Jiménez, que falhou aquilo que normalmente nunca falha — uma grande penalidade. Traoré conduziu um contra-ataque supersónico e só foi derrubado em falta já dentro da grande área, por Diego Carlos. Na conversão do penálti, o avançado mexicano foi demasiado previsível e permitiu a defesa de Bounou (13′), abdicando daquilo que seria uma vantagem preciosa numa fase ainda muito embrionária da partida.

Depois do penálti falhado, o Sevilha pegou no jogo e poderia ter marcado logo depois, através de um remate de Suso que Rui Patrício afastou (14′). A ideia do Wolves contra os espanhóis era a habitual e a normalmente aplicada na Premier League: jogar com as costas assentes no próprio meio-campo, de frente para o relvado, preferindo sempre organizar a partir de trás para depois lançar a velocidade em contra-ataque. Algo que ficou visível por exemplo, pouco antes da meia-hora, quando Traoré tentou desde logo lançar uma transição ofensiva na sequência de um corte importante de Coady (25′). Até ao intervalo, foi sempre o Sevilha a ficar mais perto do golo — Ocampos atirou ao lado (37′), Jordán rematou para Patrício encaixar (42′) –, com o Wolves a ter alguma dificuldade na hora de desdobrar o ataque e empurrar a equipa adversária para trás.

Na segunda parte, e sem que nenhum dos treinadores tivesse feito qualquer alteração ao intervalo, a lógica manteve-se. O Sevilha continuava a ter mais bola e permanecia mais pressionante, quase sempre no interior do meio-campo adversário, empurrando por completo o Wolves para junto da baliza de Rui Patrício. Os ingleses continuavam bem organizados e a cometer poucos erros nos detalhes defensivos mas não conseguiam desbloquear a pressão inicial do Sevilha, que funcionava de forma acutilante e em toda a largura do relvado. Embora a atuar no sistema em que se sente mais confortável, a oferecer a iniciativa ao adversário para depois explorar o contra-ataque, a verdade é que o Wolves não tinha espaço suficiente para despoletar as transições e perdia a bola em zonas muito recuadas.

A equipa de Nuno Espírito Santo conseguiu soltar-se ligeiramente a partir da hora de jogo, abrindo mais a dinâmica da partida, mas as melhores oportunidades continuavam a aparecer do lado do Sevilha, com Jordán a atirar ao lado depois de um cruzamento atrasado perfeito de Ocampos (59′) e Rui Patrício a evitar o golo de En-Nesyri (62′). O treinador português trocou João Moutinho por Pedro Neto e Traoré por Diogo Jota e o Wolves passou a atuar num 3x4x3 mais claro, com este último a encostar à esquerda para oferecer velocidade na faixa. Rui Patrício ainda voltou a segurar o empate, com uma grande intervenção depois de um livre direto de Banega (77′), mas o lance da eliminatória estava guardado para os instantes finais.

Já depois das entradas de Franco Vázquez e Luuk de Jong, Banega tirou um cruzamento perfeito a partir da direita e Lucas Ocampos, a antecipar-se a Coady, cabeceou de forma perfeita e sem hipótese para o guarda-redes português (88′). Depois de uma temporada acima da média na liga espanhola, o jogador argentino estreou-se finalmente a marcar nas competições europeias e carimbou uma merecida passagem do Sevilha às meias-finais da Liga Europa.

O Sevilha foi melhor e acabou por evitar um prolongamento que seria injusto, tendo em conta a superioridade dos espanhóis na larga maioria da partida. O Wolves falhou uma oportunidade clamorosa logo nos primeiros instantes, não voltou a ter ocasiões claras para marcar e acabou por ser traído pela própria estratégia, ao esperar demasiado por espaço para avançar e enterrar-se progressivamente no setor mais defensivo. Mais de um ano depois de ter começado, a temporada do clube inglês e respetiva armada portuguesa acabou — e acabou com estrondo, com a eliminação na Liga Europa. Já o Sevilha, recordista de vitórias na segunda competição europeia, voltou a atestar que é candidato à conquista do troféu e vai defrontar o Manchester United na meia-final.