As temperaturas andam a atingir níveis bem acima do normal. Há quem esteja contente e ache que é normal passar o sábado na praia a dois ou três dias de outubro; há quem já só queira frio, lareiras, mantas e, se também for possível, o Natal; e há quem tenha passado o final da tarde a fugir da chuva na bancada do Estádio Municipal de Chaves. O Desp. Chaves-Benfica estava marcado para as 20h15 desta quinta-feira, mas a essa hora chovia torrencialmente na cidade transmontana. O relvado passou a lago e João Capela decidiu esperar dez minutos, depois mais dez e novamente mais dez até decidir que encarnados e flavienses iam mesmo a jogo. Mais de uma hora depois do estipulado inicialmente, já às 21h20, o árbitro lisboeta apitou para o início da partida.
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Ficha de jogo
Desp. Chaves-Benfica, 2-2
6.ª jornada da Primeira Liga
Estádio Municipal Eng. Manuel Branco Teixeira, em Chaves
Árbitro: João Capela (AF Lisboa)
Desp. Chaves: Ricardo; Paulinho, Maras (André Luís, 88’), Marcão e Djavan; Ghazaryan, Stephen Eustáquio e Gallo; Niltinho (João Teixeira, 68’), William e Perdigão (Avto, 89’)
Suplentes não utilizados: António Filipe, Nuno André Coelho, Jefferson e Luís Martins
Treinador: Daniel Ramos
Benfica: Vlachodimos; André Almeida, Rúben Dias, Jardel (Conti, 15’) e Grimaldo; Fejsa, Gabriel (Gedson, 63’), Rafa, Cervi e Pizzi (Jonas, 79’); Seferovic
Suplentes não utilizados: Svilar, Zivkovic, Samaris e Castillo
Treinador: Rui Vitória
Golos: Rafa (3’ e 84’), Ghazaryan (76’ e 93’)
Ação disciplinar: Cartão amarelo a Perdigão (20’), a Marcão (29’), a Gabriel (51’) e a Djavan (81’); cartão vermelho direto a Conti (87’)
Mas a verdade é que Rafa Silva é um rapaz sensato que acredita nos dizeres populares e naquelas coisas que as nossas avós nos diziam quando íamos lá comer o bacalhau ou o arroz de pato. “Depois da tempestade, vem a bonança”, tantas vezes ouvimos nós, com a certeza de que não passava de uma frase para nos fazer sentir melhor. Mas Rafa – e bem – acreditou. O médio português decidiu aproveitar o que de melhor tinha ficado da chuva torrencial que caiu em Chaves antes do jogo e lançou-se num deslize rapidíssimo para responder a um ótimo cruzamento de Cervi (que já tinha recebido um excelente passe de Seferovic). Sliding, pé esticado, golo. Estava feito o primeiro do Benfica e a avó de Rafa não podia estar mais orgulhosa.
O Desp. Chaves, por sua vez, não baixou os braços. William respondeu a um canto com um cabeceamento forte e Vlachodimos defendeu; Paulinho fez com que Jardel ainda agora esteja à procura da bola, rematou, mas Vlachodimos defendeu; e Stephen Eustáquio surgiu a cabecear ao segundo poste depois de um pontapé de livre mas – imagine-se – Vlachodimos defendeu. O guarda-redes alemão que o Benfica foi descobrir ao Panathinaikos salvou os encarnados de três golos e agarrou com mãos de ferro a vantagem que Rafa conquistou logo aos três minutos.
Gabriel atirou uma bola ao poste, o Benfica desdobrou-se em ataques de insistência que não conseguiram chegar com perigo à baliza de Ricardo e o Desp. Chaves foi para o intervalo com mais remates dentro de área, mais remates enquadrados e mais ataques. Daniel Ramos desceu ao balneário com uma certeza: só faltava bater Vlachodimos. Os flavienses mostraram ser uma equipa que não vira a cara à luta – seja o adversário o Benfica, o V. Guimarães ou o Desp. Aves – e foram mais conjunto nos primeiros 45 minutos. Stephen Eustáquio e Bruno Gallo são exímios a garantir o equilíbrio do meio-campo para que os mais virtuosos Perdigão e Niltinho procurem William.
Do lado do Benfica, Rafa, Cervi e Pizzi voltaram a sublinhar a importância dos extremos na tática de Rui Vitória. Os três elementos ofensivos foram o motor do Benfica na primeira parte e gozaram sempre da consistência de Fejsa no eixo da equipa. Seferovic, o avançado suíço que não convenceu na época de estreia, parece outro e é uma peça importante nas transições do ataque encarnado.
O Desp. Chaves regressou para a segunda parte convencido de que só faltava a estrelinha da sorte para empatar e tirou o pé do acelerador. Os primeiros minutos do segundo tempo pertenceram por inteiro ao Benfica – que em pouco tempo conseguiu recuperar a desvantagem em termos de ataques com que tinha ido para o intervalo – e Seferovic podia ter marcado por duas vezes em dois minutos (valeu Ricardo, que não deixou Vlachodimos ir para casa com o prémio de melhor guarda-redes em campo). Os rapazes de Daniel Ramos acordaram depois da ameaça do segundo golo e, muito ajudados pela refrescante entrada de João Teixeira, tomaram de assalto o meio-campo do Municipal de Chaves e saltaram de trampolim para o ataque. Eustáquio e Gallo, mais uma vez, foram as melhores pelas no xadrez flaviense e deixaram água na boca para o resto do campeonato.
O Benfica resistiu até Ghazaryan se fartar de estar a perder. O médio arménio encheu o pé num livre direto do meio da rua e não deu qualquer hipótese a um Vlachodimos que até aqui parecia ter asas. O empate durou pouco e só resistiu até Rúben Dias ter um rasgo de génio e ver espaço onde mais ninguém o encontrou – o central desmarcou Rafa, que beneficiou de uma simulação deliciosa de Seferovic e não falhou quando ficou cara a cara com Ricardo. Rui Vitória respirou de alívio, Rafa bisou na partida e a tempestade parecia ter voltado a passar.
Mas, de facto, o meio-campo do Desp. Chaves esteve esta noite absolutamente magistral. E, como também já foi dito, Ghazaryan farta-se rápido de estar a perder. O relógio já marcava três minutos para lá dos 90 e os flavienses decidiram desenhar uma pequena obra de arte: no total, foram seis toques e cinco jogadores diferentes que deixaram a defesa do Benfica sem reação. O médio arménio olhou para o alvo, voltou a encher o pé a partir do vértice da área encarnada e Vlachodimos bem voou, bem se esticou, mas o míssil já abanava as redes.
Rui Vitória deixa Chaves sob uma tempestade que fez mais do atrasar jogos e roubar pontos: Jardel saiu lesionado, Gabriel saiu lesionado, Conti viu um vermelho direto e estará com certeza indisponível para o clássico com o FC Porto. Tudo isto aliado às já preocupantes lesões de Salvio e João Félix. É tempo do treinador do Benfica ouvir a avó de Rafa e acreditar que a seguir vem a bonança.