Avisamos desde já: este é um texto que se conjuga no tempo verbal condicional. Ou seja, falamos de algo que talvez possa acontecer, mas que ainda não é facto consumado. Estamos, em suma, no mundo dos ‘ses’. Ora, o primeiro ‘se’ aconteceu a 14 de junho, dia 1 do Mundial. Um canal de televisão russo perguntou a José Mourinho quem previa que estivesse na final. E o special one não hesitou: Portugal e Argentina, ou seja, um duelo (mais um) entre Messi e Ronaldo.
Este primeiro ‘se’ já não se pode concretizar. É que o técnico português imaginava que a seleção das pampas passasse aos oitavos de final em primeiro lugar no grupo D. Mas tal não aconteceu. A equipa de Messi e companhia viu-se e achou-se para encontrar o passaporte para a próxima fase. O craque do Barcelona ainda o agarrou, a equipa perdeu-o para os nigerianos, mas afinal estava no bolso de Marcos Rojo — que se tornou o herói improvável de um percurso aos solavancos.
Ora, já dizia o outro, “isto está tudo ligado”. O facto de a Argentina ter passado em segundo lugar do agrupamento, exclui as possibilidades de um duelo com Portugal no derradeiro e decisivo jogo. Mas abre uma nova hipótese. Um segundo ‘se’. É que se a Seleção Nacional derrotar o Uruguai nos oitavos de final… e se a Argentina bater a França… há duelo entre Messi e Ronaldo nos quartos de final. Lá está… se!
Se isso acontecer, vai ser o nono encontro entre as duas seleções. Nos oito anteriores, só um foi a contar: aconteceu em 1972, no Torneio Independência, uma espécie de mini-Mundial patrocinado pelo Brasil no âmbito das comemorações dos 150 anos da independência do país. O duelo aconteceu na meia-final, que terminou com vitória portuguesa por 3-1 (golos de Calisto, Eusébio e Dinis).
De resto, só há jogos particulares a registar: o primeiro aconteceu a 1 de abril de 1928 e marcou o primeiro jogo de sempre da Argentina com uma seleção europeia. A equipa das pampas seguia para Amesterdão, a caminho dos Jogos Olímpicos, e aceitou o convite da Federação Portuguesa para um duelo no Lumiar. O árbitro era um elemento da comitiva argentina (das tais coisas que só eram possíveis há quase 100 anos…) e até assinalou um penálti contra Portugal, que Roquete defendeu. No final, o marcador não saiu do 0-0 inicial. Passaram 24 anos até ao duelo seguinte entre os dois países, a 14 de dezembro de 1952. E aí doeu. Portugal acabou derrotado por 3-1 e nem o golo monumental de Matateu seria capaz de conter Labruna e Lostau, a poderosa asa esquerda que apontou os três golos.
Quem disse que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar? Dois anos passados, os mesmos adversários, o mesmo resultado: 3-1. A Argentina estava fora das competições oficiais por uma greve dos jogadores, mas, ainda assim, deu cabo dos portugueses. Travassos ainda deu o ar da sua graça, mas a exibição apagada de Portugal haveria de sentenciar o resultado. 4 de junho de 1961, mais uma oportunidade de Portugal mudar a história. Mas ainda não era desta. 2-0 para os rivais, muito por culpa do cansaço de seis benfiquistas que tinham sido campeões europeus há quatro dias (e que eram a espinha dorsal da Seleção).
O jogo seguinte seria outro 2-0 — o raio voltaria a cair duas vezes seguidas no mesmo lugar. Em Portugal as coisas não estavam a correr bem, por isso mudou-se o jogo para o Brasil, mais concretamente para o Maracanã. A formação das quinas foi recebida com pompa e circunstância, mas a festa foi por água abaixo na segunda parte. Duas batatas de Rojas e Rendo e Portugal voltou com mais uma derrota na bagagem para contar.
Como não há mal que sempre dure, logo a seguir veio o tal jogo do Torneio Independência que deu vitória portuguesa (e derrota na final, frente ao anfitrião Brasil), mas, já neste milénio (mais especificamente em 2011), agora na Suíça, Portugal voltou a provar o amargo da derrota (2-1). Aqui já havia Messi e Ronaldo (aliás, os dois marcaram); mas ‘afinal havia outro’. Era Di Maria, bem conhecido dos relvados portugueses, a fazer a desfeita ao país onde viveu, quando atuava ao serviço do Benfica. Falta o encontro de 2014. Desta vez, Messi e Ronaldo não brilharam. Aliás, poucos brilharam num jogo baço e sem chama. Acabou por ser Raphael Guerreiro a assumir (de forma improvável) as despesas do jogo e dar uma vitória curta (1-0) a Portugal. Contas feitas, duas vitórias, um empate e cinco derrotas. É animador? Não. Mas estamos no mundo dos ‘ses’, lembra-se? E nele tudo é possível.