O PS considera que a quase ausência de concorrentes nos concursos para a contratação de meios aéreos para a época deste ano se explica com a “lógica de cartelização das empresas que detêm estes meios. Na Assembleia da República, num debate sobre a preparação da próxima época de fogos, o deputado José Miguel Medeiros disse que as empresas “apresentaram valores deliberadamente acima” dos propostos pelo Governo.

O debate foi agendado a pedido do CDS, que queria questionar o Governo sobre aquilo que está a ser feito para prevenir que a “tragédia” de junho e outubro de 2017 não se repete nos próximos meses. Na intervenção inicial, Telmo Correia assinalou o facto de, dois concursos depois, “o problema não estar resolvido”. O deputado centrista contesta a certeza do ministro de que tudo estará pronto para o combate aos incêndios e que o país terá mais meios disponíveis do que alguma vez teve. “Isso é retórica”, diz Telmo Correia.

A resposta do PS veio pela voz de José Miguel Medeiros. O deputado — que foi secretário de Estado da Proteção Civil entre fevereiro de 2008 e outubro de 2009 — acusou o CDS de “ignorar tudo o que está a ser feito” para preparar a época que começa dentro de dois meses e diz que a oposição prefere apostar num “discurso catastrofista” sobre este tema.

Medeiros diz que os partidos da oposição “aproveitam com total despudor” a ausência de propostas, como se estivesse em causa uma “ação deliberada” do Governo. Para o socialista, o vazio dos concursos explica-se com a estratégia de “cartelização” das empresas que detêm os helicópteros e os aviões de combate aos fogos. Empresas que, “não se apresentaram ou apresentaram-se com valores deliberadamente acima” da proposta pelo Governo para a contratação destes aparelhos.

“O cartel era antes, era desde 2015, quando o PS começou a governar”, devolveu Telmo Correia. O centrista justificou a insistência neste ponto — a contratação de meios — com o facto de ser “essencial” ter meios disponíveis porque é “enquanto as chamas são pequenas que é possível apagar” o fogo. O deputado quis, afinal, saber, como vai o Governo resolver este dossiê: ajuste direto? Recurso ao estrangeiro?

O ministro voltou a garantir: “Portugal está mais preparado que alguma vez teve” em matéria de meios aéreos. Mas nunca explicou onde estão esses meios, ou como vão ser contratados. Haverá “meios como nunca existiram”, com “helicópteros e aviões pesados disponíveis todo o ano”, disse apenas Eduardo Cabrita.

À esquerda do PS, os partidos também pegaram no tema. A deputada Sandra Cunha (BE) perguntou ao ministro da Administração Interna “como se assegura que estaremos com capacidade” para enfrentar os fogos e “com que meios aéreos Portugal poderá contar”. E o PCP, por Jorge Machado, sublinhou que “inda faltam 28 helicópteros para completar o dispositivo” de meios aéreos. “Estamos numa posição muito difícil do ponto de negociar” a contratação de mais, refere o comunista, que ainda assinala o facto de não haver um único Kamov “operacional”, sendo que “o Estado não tem qualquer meio para inverter a situação”. Para o PCP, há uma “necessidade imperiosa de o Estado adquirir meios” aéreos de combate a incêndios.

Força Aérea envolvida no resgate e no rescaldo

Na resposta aos parceiros parlamentares, o ministro da Administração Interna não esclareceu como vai garantir os meios em falta. Admitiu uma “fragilidade” na resposta do Estado aos incêndios, e disse que o Governo tem de “encontrar soluções a dois tempos, com serenidade e sem esta agitação de quem tem a consciência pesada sobre esta matéria”, disse Cabrita. O ministro disse que a Força Aérea vai assegurar “o apoio a transporte e o apoio à evacuação” de pessoas afetadas pelos fogos.

Eduardo Cabrita — que já recebeu as conclusões do grupo de trabalho que estudou o envolvimento da Força Aérea na gestão dos meios aéreos — deixou claro que “esses meios próprios não estarão disponíveis este ano”. Quando estiver, aquilo que se prevê é que os militares daquele ramo vão dar “apoio ao transporte e apoio à evacuação” dos locais afetados e vão também garantir uma “resposta na fase de rescaldo e de verificação de riscos” que se tenham prolongado para lá da “fase mais áspera de incêndios”. E, “pela primeira vez”, estarão disponíveis “aviões de coordenação da operação de meios aéreos”.

Isso, no melhor dos cenários, só no próximo ano. Uma questão mais imediata é como vai o Governo resolver a questão dos três Kamov parados. No final da semana passada, a Autoridade Nacional de Proteção Civil impediu a empresa contratada para fazer a manutenção dos helicópteros de ter acesso a estes aparelhos. Cabrita recordou que essa decisão foi tomada depois de a Everjets ter sido “notificada para o pagamento de penalidades por incumprimentos” contratuais nos anos de 2017 e 2018 que já “ascendem a quatro milhões de euros” — está em causa a compensação a pagar por cada dia que as aeronaves estão inoperacionais, um valor que a empresa ainda não pagou ao Estado. Quanto a soluções, o ministro da Administração Interna diz que o executivo está “a ponderar todas as soluções na defesa de interesse público”.