Vladimir Putin. Se, no Ocidente, perguntarem num vox pop ao cidadão comum quem é o presidente russo, que além de vários mandatos como chefe de Estado também foi primeiro-ministro da Rússia, é muito provável que tenha o seu nome na ponta da língua. Já de Volodymyr Zelensky, cuja cara passou a estar diariamente na imprensa internacional, dificilmente se poderá dizer o mesmo. E se o nome do presidente ucraniano não fazia parte do léxico comum antes da invasão russa, o que se dirá dos apelidos dos autarcas de cidades como Kiev ou Kharkiv?
O palco da guerra trouxe para a cena internacional muitas caras pouco conhecidas da opinião pública e cujos nomes raramente eram citados na imprensa. A 24 de fevereiro, tudo mudou. O Observador faz aqui um resumo dos principais protagonistas da guerra.

▲ Vladimir Putin, presidente russo
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Vladimir Putin, o encenador
Presidente russo
No teatro, o encenador é a peça chave: toma todas as decisões fundamentais sobre o que os atores vão fazer e como vão fazê-lo, coordena tudo e todos, para que, quando as cortinas sobem, o espetáculo decorra como planeado. Na invasão da Rússia, Vladimir Putin é o encenador, o dramaturgo e o protagonista principal. Sem o presidente russo, não haveria invasão da Ucrânia.
O antigo agente do KGB, que depois da queda da União Soviética entrou para o xadrez político do país, apoiado por Boris Yeltsin, o então chefe de Estado, começou por posicionar as suas tropas perto da fronteira com a Ucrânia e, apesar dos vários alertas internacionais de que estaria a preparar uma invasão, negou-o sempre. Assim como nega atacar alvos civis, embora as imagens que correm mundo indiciem o contrário. Acabaria por reconhecer as regiões separatistas de Lugansk e Donetsk como Estados independentes, selou laços de diplomacia com os novos aliados, e enviou tropas para dentro da fronteira ucraniana, chamando-as de forças de manutenção de paz.
Depois de uma semana de guerra, não há quaisquer dúvidas de que a Rússia, seguindo ordens de Putin, lançou uma ofensiva total ao país vizinho.

▲ Volodymyr ZElensky, presidente da Ucrânia
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Volodymyr Zelensky, o antagonista
Presidente ucraniano
Se Putin é o protagonista principal, a Zelensky terá de caber o papel de antagonista, ou seja, a personagem que enfrenta o Presidente russo, tornando-se uma pedra no seu sapato e impedindo-o de concretizar os seus objetivos — neste caso, a rápida queda de Kiev. Mesmo que o antagonista seja normalmente o vilão num filme, é Putin quem está na berlinda da comunidade internacional, enfrentando duras sanções.
O Presidente ucraniano, mais do que um chefe de Estado, veste agora a pele de herói e líder da resistência para os ucranianos: recusou-se a abandonar o país quando os EUA se ofereceram para o tirar de lá e é visto regularmente em vídeos publicados nas redes sociais em que apela à mobilização dos ucranianos na resistência contra a ofensiva russa. Se envia mensagens aos ucranianos, também se dirige aos russos, a quem pede que não travem uma guerra em nome de Putin. Na diplomacia, também não tem falhado e mantém contacto permanente com líderes internacionais, que vai publicando no Twitter.
Zelensky, o comediante que se tornou Presidente da Ucrânia e que agora luta contra Putin
Pelo caminho, conseguiu que a Ucrânia estivesse mais perto do que nunca de uma adesão à União Europeia, que o Ocidente se unisse para condenar a invasão russa, e que Putin e os seus oligarcas, assim como a própria Rússia, estejam a ser alvo de pesadas sanções.
Ao sétimo dia de guerra, apesar dos avanços russos, Kiev mantém-se de pé e os ucranianos mantêm uma resistência à invasão com que o Kremlin não contava.

▲ Sergey Lavrov, ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia
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Sergey Lavrov, o compositor
Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia
Tal como um compositor cria a banda sonora de um filme, Lavrov cria a mensagem que a Rússia quer passar para o exterior e para o seu próprio povo. O tom é duro, agressivo, desafiador e, muitas vezes, carregado de sarcasmo. Há quase 18 anos que Sergey Lavrov é a cara da Diplomacia russa — durante esse tempo, os Estados Unidos tiveram sete secretários de Estado — e é uma das poucas caras russas que se podem encontrar em t-shirts à venda nas bancas para turistas da Praça Vermelha.
Se, em 2008, Lavrov respondeu a uma reprimenda do então secretário de Relações Exteriores britânico, David Miliband, com um “Quem julga que é para me dar um sermão?” — em inglês, a frase, dita ao telefone, levava a F word antes do você e é um êxito nas t-shirts — , agora não hesita em apelidar o Ocidente de arrogante ou de considerar que os EUA são vaidosos, traiçoeiros e que estão determinados a dominar o mundo.

▲ Dmytro Kuleba, ministro ucraniano dos Negócios Estrangeiros
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Dmytro Kuleba, o comunicador
Ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia
Tem funções idênticas às de Lavrov, mas do lado ucraniano. Dmytro Kuleba não tem o ar rude do ministro russo, mas tem subido o tom de agressividade à medida que os dias da guerra se sucedem. Uma das suas frases mais recentes foi pedir “a desputinização do mundo”. A sua ferramenta de comunicação preferida é o Twitter — é ali que, várias vezes por dia, garante que toda a informação sobre o cenário de guerra está disponível a quem a procura. Um dos seus principais papéis, como agente da comunicação da Ucrânia, é responder aos ataques de Lavrov, publicar imagens da destruição de zonas civis na Ucrânia, e agradecer, em voz bem alta, os apoios que têm recebido.
Esse trabalho de bastidores também faz parte das suas competências: fazer telefonemas diários aos líderes de todo o mundo, reunindo o maior apoio possível para a Ucrânia.
O elenco de atores secundários

▲ Oleksiy Reznikov, ministro da Defesa ucraniano
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Oleksiy Reznikov
Ministro da Defesa da Ucrânia
O cargo é recente: há quatro meses, a pasta da Defesa passou para as suas mãos. Antes de novembro de 2021, a sua pasta era outra — ministro da Reintegração dos Territórios Ocupados Temporariamente da Ucrânia. Advogado de profissão, nascido em Lviv, Oleksiy Reznikov é um dos homens responsáveis por conseguir chegar a um acordo com os russos, nas negociações que já tiveram duas rondas na Bielorrúsia. Lidera a equipa que tenta encontrar um caminho para a paz pela via da diplomacia, a par com Mykhailo Podoliyak, conselheiro de Zelensky e negociador principal.

▲ Davyd Arakhamia, dirigente do partido Servos do Povo
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Davyd Arakhamia
Dirigente do partido Servos do Povo
É o homem do boné. Davyd Arakhamia é um dos negociadores ucranianos que chamou a atenção de todos devido à forma como apareceu vestido para as negociações na Bielorússia. Dirigente do partido Servos do Povo, o partido de Zelensky, foi considerado em 2021 um dos mais influentes ucranianos (o sexto num ranking de 100).

▲ Leonid Slutsky, presidente da comissão de Negócios Estrangeiros da Duma
Sergei Karpukhin/TASS
Leonid Slutsky
Presidente da comissão de Negócios Estrangeiros da Duma
É o número um da equipa de Vladimir Putin nas conversações que têm lugar na Bielorússia. Horas antes de o presidente russo dar luz verde às tropas para invadirem a Ucrânia, Leonid Slutsky (que em 2018 esteve envolvido num caso de assédio sexual, mas foi absolvido pela Duma, o parlamento russo) garantia que não haveria conflito armado: “Não pretendemos dar início a nenhuma guerra. Não vamos invadir a Ucrânia, como estamos a ser acusados na própria Ucrânia e não só”.

▲ Vladimir Medinsky
Viktor Tolochko/POOL/TASS
Vladimir Medinsky
Conselheiro do Presidente da Rússia
Político, professor e publicitário russo, é autor de três teses de doutoramento — sobre duas delas recaem acusações de plágio. Membro do Conselho Geral do partido Rússia Unida, referiu-se à Ucrânia, em declarações recentes, como “um fantasma histórico construído como consequência de decisões táticas de políticos em circunstâncias específicas.”

▲ Vitali Klitschko, autarca de Kiev
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Vitali Klitschko
Autarca de Kiev
Antes de ser político, o autarca de Kiev foi lutador de boxe, chegando a ser campeão mundial de pesos-pesados. Desde que a guerra começou, Vitali Klitschko, assim como o seu irmão, também pugilista, pegaram em armas e juntaram-se à resistência nas ruas da capital do país.
Além da luta armada, o autarca de Kiev, que era conhecido como o Dr. Punhos de Ferro, tem feito questão de denunciar o que se passa na capital, divulgando vídeos com os ataques russos nas redes sociais, como fez, por exemplo, com as imagens da torre de televisão atingida pelos militares. Com 50 anos, é filho de um general ucraniano da Força Aérea Soviética, e era visto como um potencial candidato a Presidente da Ucrânia.

▲ Oleg Synegubov, autarca de Kharkiv
Oleg Synegubov
Autarca de Kharkiv
É a cara da resistência em Kharkiv. O autarca da cidade, tal como o seu colega de Kiev, tem mantido presença ativa nas redes sociais para mostrar o que se passa nas ruas da cidade que tem estado sob duro ataque das forças russas. Não tem poupado nas palavras e foram várias as vezes em que acusou a Rússia de atacar alvos civis, condenando “os crimes de guerra” e falando de “genocídio do povo ucraniano.”

▲ Sergiy Kyslytsya, embaixador ucraniano nas Nações Unidas
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Sergiy Kyslytsya
Embaixador da Ucrânia nas Nações Unidas
Os seus discursos na ONU têm sido emotivos e chamaram a atenção dos media. A 24 de fevereiro, quando o Conselho de Segurança se reunia de emergência para procurar uma solução para a escalada de tensão, Putin falava ao mesmo tempo na televisão russa. A guerra tinha começado. Nessa noite, Kyslytsya pôs o seu discurso de lado porque já era “inútil”, pegou na carta das Nações Unidas e acusou a Rússia de não ser capaz de cumprir as suas obrigações. Desafiou o embaixador russo, Vasily Nebenzya, a pegar no telemóvel e a ligar a Lavrov, para que o ministro lhe dissesse o que realmente estava a acontecer.
Já depois da invasão russa, num discurso, na última quarta-feira, o embaixador sugeriu a Putin que seguisse o exemplo de Hitler, suicidando-se num bunker. “Se ele se quer matar a ele próprio, não precisa de utilizar arsenal nuclear. Só precisa de fazer o que o outro tipo [Hitler] fez em Berlim, em 1945.”