Jack Ma, o homem mais rico da China e o 17.º mais rico do mundo (contas da Forbes), abriu uma conta pessoal no Twitter em março, em pleno surto de Covid-19. Até agora, os tweets do co-fundador e ex-presidente executivo do grupo Alibaba foram exclusivamente dedicados ao combate à panademia, em particular para as doações que vai fazendo. Num dos tweets destaca que já fez donativos para mais de 150 países. Jack Ma doou, por exemplo, 30 ventiladores à câmara municipal do Porto. Mas com o grande esforço filantrópico de Ma, como regista a BBC, surgem dúvidas, até entre os que apoiam as suas ações, se Jack Ma está a envolver-se pessoalmente, se é simplesmente o “rosto simpático” do Partido Comunista Chinês ou se é alguém independente que é utilizado pelo partido como propaganda.
O mesmo artigo da BBC explica que Jack Ma parece estar a seguir o jogo diplomático da China, principalmente quando escolhe os países que devem beneficiar das suas doações. Por outro lado, caso não esteja debaixo do guarda-chuva do Estado chinês, esta sua ascensão como rosto do país pode criar alguns ciúmes no topo do regime. O que o colocaria em maus lençóis, mesmo sendo um dos homens mais poderosos da China (como comprovam os 41,8 mil milhões de euros). O Alibaba é um gigante chinês de e-commerce, conhecido como a “Amazon da China” ou a “Amazon do Oriente”.
Following donations to 150+ countries & regions, we will provide 100M masks, 1M N95 masks, and 1M test kits to @WHO. The supplies will be distributed to those in most need. Together, we must move faster and with confidence to overcome this global challenge. #OneWorldOneFight
— Jack Ma (@JackMa) April 21, 2020
O último tweet de Jack Ma dá conta dos 150 países que já apoiou, bem como que vai doar 100 milhões de máscaras, um milhão de máscaras N95 e mais um milhão de testes à Organização Mundial de Saúde. Esta doação à OMS surgiu seis dias depois de Donald Trump ter anunciado que ia cortar o financiamento à organização liderada pelo etíope Tedros Adhanom Ghebreyesus.
Na lista de doações privadas ao combate ao surto de Covid-19, levantamento feito pela Candid – associação que torna transparente os donativos feitos em ações de filantropia – a Fundação Alibaba de Jack Ma aparece em 12.º lugar com doações de 144,2 milhões de dólares. Já o co-fundador do Twitter, Jack Dorsey, está em primeiro lugar, com doações de mil milhões de euros.
Jack Ma consegue enviar material hospitalar com muita facilidade. A Fundação Jack Ma transportaram suprimentos para África, Ásia, Europa e América Latina, incluindo países politicamente sensíveis, como o Irão, Israel, Rússia ou os EUA. Dificilmente isto seria feito sem o apoio do governo chinês. O seu biógrafo, Duncan Clark, disse à BBC que ele “tem capacidade, dinheiro e influência para levar um avião de suprimentos chinês de Hangzhou para aterrar em Adis Abeba, ou para onde for preciso”.
Jack Ma é conhecido por ser o pacato professor de inglês que criou a maior empresa de tecnologia da China, que começou a criar num minúsculo apartamento em Hangzhou, em 1999. Apesar de ter deixado a liderança da empresa em 2018 – para se dedicar à finlantropia – continua a ter um “seat on the table” na administração..
Aparentemente, Jack Ma está a seguir as regras diplomáticas da China, já que não há provas de que qualquer material médico tenha sido enviado para países com laços formais com Taiwan, rival da China. O fundador do Alibaba fez doações para 22 países da América Latina, mas Honduras e Haiti (que também pediram suprimentos, mas têm relações diplomáticas com Taiwan) não receberam qualquer ajuda de Ma.
O estado chinês também tem enviado vários suprimentos, mas há várias acusações de terem chegado produtos defeituosos que não servem os seus propósitos. A lista de reclamações é longa, ao contrário do que acontece com as doações do filantropo. Aparentemente, Xi Jiping sai mal da fotografia quando comparado com Jack Ma.
Xi Jinping tem ciúmes de Jack Ma?
Ashley Feng, investigadora associada do Centre for New American Security, em Washigton disse à BBC que “circula um boato de que [Jack Ma] deixou o cargo em 2018 como presidente do Grupo Alibaba porque era visto como um self made man cuja popularidade poderia eclipsar a do Partido Comunista”. Ma negou sempre essa versão. Ele negou rumores persistentes de que Pequim o forçou a sair de sua posição.
O biógrafo de Ma associa o afastamento de Ma a um incidente em janeiro de 2017, quando o milionário se encontrou com Donald Trump na Trump Tower para discutir o comércio entre os dois países. Terá havido alguma descoordenação com o regime, o que não foi do agrado de Xi Jiping. Por outro lado, Ma está longe de ser um outsider ou um enfant terrible do regime chinês e é membro do Partido Comunista desde os anos 80. No entanto, é-lhe conhecida a frase de que “está apaixonado pelo partido, mas não casaria com ele”.
Duncan Clark, biógrafo de Ma, também está ciente dos relatos de que Ma foi afastada do Alibaba após um incidente importante em janeiro de 2017. O bilionário chinês se encontrou com o então presidente eleito Donald Trump na Trump Tower, ostensivamente para discutir o comércio sino-americano. O presidente chinês não se encontrou com Trump até meses depois.
Resta assim saber se Ma é um peão do estado chinês ou se pode ter conseguido o que nunca nenhum outro conseguiu: tornar-se indispensável ao ponto de não poder ser afastado do panorama global. O biógrafo Duncan Clark diz que Jack Ma já fazia parte da elite do regime, pelo peso do Alibaba, mas o acesso a líderes mundiais torna-o num ativo valioso para Pequim, ainda para mais numa altura em que a China precisa de reconstruir a sua imagem.
Andrew Grabois, da associação Candid, diz que o estado chinês é beneficiado pela ação de Jack Ma, além de que a “China está a assumir o papel de liderança na resposta à crise que antes era feito pelos EUA”. E lembrou que foram os EUA a enviar uma resposta rápida ao ébola e ajudar a travá-lo antes de chegar à África Ocidental em 2014. O biógrafo de Jack Ma acha que esta não é a melhor altura para a China tirar Jack Ma do mapa.