A maior central sindical do país aprova este sábado as linhas de orientação para os próximos quatro anos, com o “desafio aliciante”, como lhe chama Arménio Carlos, de ter, pela primeira vez, uma maioria de esquerda no Parlamento a apoiar o Governo. Os últimos quatro anos (o primeiro mandato do atual líder) coincidiram com PSD e CDS no Executivo e a troika no país, o que levou a que 40% do tempo em que Passos Coelho esteve em funções a CGTP (ou os seus sindicatos) estivesse na rua.
Ao todo, foram 639 ações em 1.566 dias do Governo PSD/CDS, de acordo com as informações prestadas ao Observador pela central, que especifica o que foi luta setorial (ações dos sindicatos de cada setor, junto de fábricas, empresas, serviços públicos) e as ações de luta geral (manifestações, marchas e as greves gerais). E com a esquerda no poder, a luta continua? Na entrevista que deu ao Observador, Arménio Carlos garante que sim.
Os números colocam 2012 como o ano mais forte. Foi o ano do memorando da troika e aquele em que se fizeram duas greves gerais, uma em março e outra em novembro. A primeira (do tempo do Governo PSD/CDS) foi longo em 2011, seguiram-se as duas de 2011 e mais uma em 2013. Duas delas foram convocadas em conjunto pelas duas centrais, a CGTP e a UGT. O congresso que acaba este sábado vai definir os tempos que se seguem, num panorama bem diferente do anterior e de todos os que o antecederam. Com a esquerda ao comando, a central sindical recusa que o seu destino seja ficar acantonada. Arménio Carlos diz que a situação implica um “desafio” maior, apontando sobretudo como caminho a “rentabilização” do atual quadro político.
Espinhos
Neste ponto há consenso dentro da CGTP, mas não se pense que tudo são rosas. Este congresso também trata de questões internas, com alterações aos estatutos pretendidas que acabam por opor as várias correntes. O Conselho Nacional da CGTP tem representadas três correntes sindicais, a comunista (dois terços do órgão de direção), a socialista e a do BE, além de vários independentes. Uma distribuição que as correntes minoritárias queriam alterar, garantindo maior representatividade das tendências mais pequenas. No caso dos socialistas, a proposta de alteração aos estatutos pretendia que a eleição para o Conselho Nacional seja por representação proporcional. Já os bloquistas queriam que não só existisse maior representatividade das várias correntes no Conselho Nacional, mas também na Comissão Executiva da central.
Há quatro órgãos de direção. O Conselho Nacional (147 membros) é eleito pelos delegados ao congresso, a Comissão Executiva (entre 20 e 30 membros) é eleita pelo Conselho Nacional, bem com o secretariado (entre 3 e 7 membros) e o secretário-geral. Daqui se percebe a importância de ter representação no Conselho Nacional, o órgão que determina a composição do topo da CGTP e onde os comunistas dominam sem quererem abrir mão dessa maioria. “Não temos ilusões, sabemos quem são os delegados presentes no congresso”, dizia Francisco Alves, o porta-voz da corrente do BE ao Observador dias antes do congresso. “A discussão é dura e a maioria não estará disponível para aceitar a proposta”, acrescentava.
A discussão é dura e a maioria não estará disponível para aceitar a proposta [para aumentar a representatividade das correntes na direção da central]
No Conselho Nacional de preparação do Congresso, as propostas já foram chumbadas, mas vão ser levadas pelas correntes à votação na reunião magna da central sindical. “É um debate democrático que vale a pena continuar a fazer”, dizia Alves. Num Manifesto publicado na véspera do Congresso, a corrente voltou a defender que a sua proposta de representação proporcional do Conselho Nacional é um “contributo para melhorar a qualidade da participação e a democracia no funcionamento interno da CGTP-IN”.
Concluímos que não era este o momento nem a matéria oportuna para fazermos qualquer clivagem
Da corrente sindical socialista, Carlos Trindade lembra que estiveram “muitas semanas a discutir, nos órgãos de direção, mas na reunião de 15 de fevereiro ficou definido que se mantêm os equilíbrios”. “Concluímos que não era este o momento nem a matéria oportuna para fazermos qualquer clivagem”. O sindicalista atira mesmo, lembrando o atual quadro político de maioria parlamentar de esquerda: “Só se fossemos tontos é que não considerávamos que este é um momento diferente de todos os que temos vivido”. Ou seja, o Conselho Nacional “a lista foi aprovada por unanimidade sem problemas”, conta Francisco Alves. Mas continua a considerar importante que o método de composição das listas seja alterado no futuro.
Na verdade, a maioria dos 730 congressistas da CGTP chumbou, esta sexta-feira, as alterações aos estatutos da central sindical, que permitiriam o direito de tendência. Só houve 44 votos a favor e 11 abstenções.