A indústria vai mudar. Ou já está a mudar. “A internet, as redes sociais, a digitalização da indústria já está em curso”, diz ao Observador António Correia, da PricewaterhouseCoopers. Está a nascer aquilo a que muitos chamam “a quarta revolução industrial” (ou Indústria 4.0) e para o especialista na área de produtos industrias e serviços, não há dúvidas: “o processo é irreversível” e vai aumentar “seguramente, nos próximos anos”.

O que falta, então, em Portugal? “Marcas fortes que permitam desenvolver segmentos de maior valor acrescentado” na indústria, aponta Luís Carneiro, administrador do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência – INESC TEC. E uma maior coordenação “entre empresas, academia e Governo”, acrescenta António Correia.

Entre 13 e 15 de abril, é isto que que empresários, empreendedores e profissionais do setor industrial discutem na conferência “Indústria do Futuro”, em Amarante: “o contributo da inovação para o sucesso industrial” do país. Mais: querem ajudar a indústria portuguesa a tornar-se mais competitiva “à escala mundial”.

Qualquer um de nós — empresas e cidadãos — tem a possibilidade de fazer algo neste tipo de revolução industrial, em qualquer ponto do globo. E essa é uma vantagem, pois todos estamos ‘próximos’ [ligados pelas novas tecnologias, numa ‘aldeia global’]. Porém, gera igualmente uma competitividade nunca antes vista, pois é também à escala mundial”, afirmou António Correia.

E como é que se “trilha um caminho de sucesso, rumo à Indústria do futuro?”, perguntam os organizadores da conferência. António Correia responde: apostando “na inovação e tecnologia”, “tendências seguras” nos próximos anos.

“A indústria portuguesa tem ainda, quando comparada com alguns países europeus, uma produtividade baixa, cerca de 70% da média comunitária. Esse facto está muito relacionado com o tipo de indústria que temos: à volta de 75% [das empresas nacionais] possui uma intensidade tecnológica média baixa”, explicou

Luís Carneiro defende o mesmo: a Quarta Revolução Industrial “implica investir em novas soluções tecnológicas e no desenvolvimento dos recursos humanos” das empresas nacionais. “A Indústria 4.0, como processo de digitalização das atividades industriais, tem um vasto conjunto de vantagens, incluindo a melhoria da eficiência das operações, aumento da flexibilidade e melhoria na tomada de decisão, através da disponibilização de mais informações e melhores ferramentas de análise [para os industriais]”, afirmou.

Em Portugal, há “falta de marcas fortes”

O setor industrial tem tido um crescimento ténue nos últimos anos. Em Portugal, por exemplo, os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) apontam para um crescimento de 1,1%, em fevereiro de 2016, face ao mês anterior. As variações, contudo, não têm sido significativas em termos anuais e o crescimento do setor, em termos globais, tem sido inferior ao desejado. O que poderá mudar quando a quarta revolução chegar em definitivo: “Prevê-se que mundialmente a eficiência na Indústria 4.0 cresça quase 5% ao ano e as receitas subam 3% ao ano”, afirma António Correia.

Para que Portugal siga a tendência tem de haver uma maior coordenação “entre empresas, academia e Governo”, “mais dirigida e pensada em função das necessidades dos empresários e da economia portuguesa”, defende o responsável. Já Luís Carneiro acrescenta que “a inovação de produto tem sido menos frequente”, mas não deixa, contudo, de traçar um retrato positivo das empresas nacionais.

Temos no país excelentes empresas que têm conseguido crescer no mercado global, através de resposta rápida e competitiva, inovando sobretudo no processo e no modelo de negócio e implementando novas tecnologias de produção. É de salientar também o crescimento das empresas fornecedoras de equipamentos industriais e sistemas de informação e o papel dinamizador das associações relacionadas com este setor, incluindo o Cluster das Tecnologias de Produção – PRODUTECH.”

Maiores perigos: menos empregos e maiores desigualdades

Contudo, nem todos os dados referentes à digitalização e inovação tecnológica na Indústria são positivos. Um estudo do Fórum Económico Mundial (WEF), revelado em janeiro, sugeria que a quarta revolução industrial provocará “grandes perturbações não só no modelo dos negócios, mas também no mercado de trabalho nos próximos cinco anos”. Ao todo, estimava o relatório, o processo pode levar à perda de cinco milhões de empregos, nos próximos cinco anos.

Os problemas, contudo, não se esgotam aqui. Segundo um relatório do banco suíço UBS, publicado no mesmo mês, é expectável que a digitalização da Indústria aumente as desigualdades, “não apenas entre países desenvolvidos e países emergentes e em desenvolvimento”, mas também “dentro da nossa sociedade [suíça, no caso] “. Pelo que os benefícios do crescimento do setor podem beneficiar sobretudo aqueles que possuem mais “rendimentos, capacidades e riqueza”.

Muitas empresas de trabalho intensivo devem ser capazes de aumentar as suas margens de lucro ao substituírem trabalhadores caros por robôs mais baratos ou por software inteligente… Para as nações, os maiores ganhos resultantes da quarta revolução industrial provavelmente deverão ficar para os países que que tenham uma economia mais flexível, trazendo um incentivo mais forte para que os governos eliminem a burocracia e as barreiras às empresas”, acrescentava o relatório.

As mudanças poderão, contudo, ser uma oportunidade para as economias que se adaptarem mais rapidamente ao novo contexto empresarial que afetará a indústria. Segundo a BBC, “os países que lideram estas novas alterações na Indústria poderão ter ganhos significativos em termos de produtividade económica”, pelo que a quarta revolução industrial, “para alguns, e para a Europa Ocidental no seu todo, apresenta-se como uma oportunidade para reverter um declínio épico [no crescimento] que já dura há uma geração”.